Tempo de contribuição é mantido em 15 anos também para homens: destaque corrige uma das regras mais problemáticas na Reforma da Previdência

* por Luis Lopes Martins, mestre em Direito da Regulação pela FGV/RJ e doutorando em Direito do Trabalho e Previdenciário pela UERJ.

Foto: Luis Macedo/Câmara dos Deputados

A aposentadoria por idade é hoje a principal prestação na maioria dos sistemas previdenciários no mundo, e no Brasil não é diferente. Como muito se discutiu na atual Reforma da Previdência, ele é o benefício de aposentadoria mais relacionado com a proteção de trabalhadores mais pobres e de grupos vulneráveis.

Os dados estatísticos mostram bem essa realidade: a imensa maioria das aposentadorias por idade é concedida em patamar igual ou próximo ao salário-mínimo e o valor médio desse benefício é um pouco superior a R$ 1.000,00. Quando comparado com a aposentadoria por tempo de contribuição, cujo valor costuma superar R$2.000,00 (mesmo com a aplicação do fator previdenciário), fica claro que o primeiro benefício é a grande forma de proteção previdenciária para as camadas mais pobres da população ao atingirem idades avançadas.

A explicação é simples. O sistema previdenciário brasileiro ainda é bastante marcado pelo modelo securitário, que somente garante proteção social àqueles que contribuem para o regime. Nos tempos atuais, existe um crescente consenso sobre as falhas dos sistemas securitários, que tendem a ser mais severos com trabalhadores de baixa renda, com menor escolaridade e com outros grupos vulneráveis que costumam passar maiores períodos na informalidade e apresentam índices maiores de desproteção previdenciária. Essa é uma questão particularmente preocupante no Brasil, onde a informalidade é superior a 40% da população economicamente ativa, tendência ainda mais aprofundada por fenômenos como a gig economy.

É difícil que esses trabalhadores consigam completar 30 ou 35 anos exigidos para a aposentadoria por tempo de contribuição. Quando atingem os requisitos necessários para obter algum benefício em face da velhice, alcançam apenas a aposentadoria por idade, que na legislação atual exige 15 anos de carência.

Por isso, um dos pontos mais graves do texto original de Reforma da Previdência proposta pelo governo (PEC 06/2019) era seu art. 24, II, que aumentava para 20 anos o tempo de contribuição [1] exigido para a concessão de aposentadoria por idade. De forma muito mais crítica que as normas que endurecem as fórmulas de cálculo e reduzem os benefícios, essa regra potencialmente implicaria a completa exclusão previdenciária de grandes massas de segurados que não conseguissem completar o novo requisito, ficando sem qualquer cobertura protetiva [2].

Esse dispositivo já havia sido alterado na Câmara, que passou a prever, no art. 20 do substitutivo aprovado pela Comissão Especial, a manutenção do tempo de contribuição de 15 anos para as mulheres. A alteração final desse questionável aumento do tempo de contribuição para a aposentadoria por idade veio na madrugada de ontem, quando foi aprovado pela ampla maioria de 445 votos a 15, destaque apresentado pelo PSB para a manutenção da exigência atual de 15 anos para segurados de ambos os sexos.

A mudança parece acertada. O sistema previdenciário brasileiro já é demasiadamente excludente, falha que a Reforma da Previdência não corrige. A manutenção do prazo de carência do principal benefício previdenciário para os trabalhadores mais vulneráveis significa, ao menos, não agravar ainda mais as exclusões atuais.

Fontes:

[1] Apesar de a legislação atual exigir tempo de carência, a reforma trata de tempo de contribuição.

[2] A cobertura assistencial do benefício de prestação continuada previsto na LOAS é restrita àqueles que demonstrarem viver em situacao de miséria econômica.

Autor: Luis Lopes Martins

Mestre em Direito da Regulação pela Fundação Getulio Vargas - FGV/RJ e doutorando em Direito do Trabalho e Previdenciário pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ. Ex-pesquisador do Centro de Pesquisas em Direito e Economia - CPDE/FGV.

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