*por Yuri Kuroda Nabeshima (advogada, mestre em Direito Internacional do Trabalho e especialista em Direito do Trabalho pela USP, pesquisadora visitante pela Universidade de Tóquio)

Segundo o Global Gender Gap Report 2018, organizado pelo Fórum Econômico Mundial, o Japão ocupa a 110ª posição no ranking da igualdade de gênero no rol de 149 países pesquisados. O Japão apresentou uma pequena melhora em relação ao ano anterior, subindo quatro posições, porém ainda permanece como o pior país colocado se levarmos em consideração as maiores economias do mundo.
Não obstante ser signatário da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação desde 1980, o Japão ainda encontra grandes dificuldades em garantir condições igualitárias de trabalho em razão do gênero. Consoante aponta o referido relatório, mesmo após a implementação das ações do governo Shinzo Abe em prol da valorização da participação da mulher no mercado de trabalho, os dois maiores desafios ainda a serem superados pelo Japão dizem respeito a (i) participação e oportunidade econômica, e (ii) empoderamento político.
De fato, a participação da mulher no mercado de trabalho ainda é tímida, sobretudo quando nos atentamos à fração representada nos cargos de liderança e gerência. Conforme indica pesquisa realizada por Reuters Corporate Survey em setembro de 2018, apenas 10% das empresas japonesas afirmaram ter mulheres em 10% dos cargos de gerência, 75% das empresas disseram ter menos de 10%, e 15% informaram não ter nenhuma mulher.
Dentre as metas proposta por Abe está aumentar o número de mulheres em cargos de gestão para 30% e para cargos de executivo sênior para 10% até 2020. De acordo com projeções do Ministério do Trabalho, Saúde e Bem Estar, caso não seja garantido um aumento da força de trabalho feminina com urgência, a população economicamente ativa do país se reduzirá drasticamente nos próximos 20 anos, caindo até 20%, o que representaria cerca de 12 milhões de pessoas a menos trabalhando e um considerável impacto na economia do país.
Uma boa notícia é que nos últimos anos tem se observado um visível aumento da força de trabalho feminina na faixa dos 30 anos. Até 2015, o gráfico representativo da população economicamente ativa feminina no Japão apresentada uma forma em “M”, indicando um declínio da participação feminina no mercado entre os 30 e 40 anos. Tal fato se explicava pela tendência das mulheres se desligarem do emprego após se casarem e darem luz aos filhos para se dedicarem exclusivamente às atividades familiares. As mulheres apenas vinham a retomar o trabalho aos 40 anos, sendo submetidas geralmente a cargos secundários, irregulares e de part-time work. Contudo, especialmente a partir de 2017, o Ministério da Saúde, Trabalho e Bem Estar tem notado que a curva em “M”, até então tão típica da situação econômico-social japonesa, tem se atenuado e se assemelhado mais à forma de uma montanha, como é padrão nos países ocidentais.
Tal conquista tem sido atribuída à política do Womenomics, especialmente a medidas relacionadas ao equilíbrio profissional-familiar (como redução e/ou flexibilidade da jornada de trabalho, licenças para cuidar de membros da família, e oferta de vagas em creches), o que tem sido bastante celebrado pelo governo japonês. Mas é importante chamar atenção para o fato de que o número de casamentos no Japão tem diminuído, assim como a taxa de natalidade, levando a crer que muitas mulheres também têm optado em investir em sua carreira profissional em detrimento da vida pessoal/familiar.
De outro lado, no que concerne à participação política, verificamos que o governo estipulou como meta aumentar o número de candidatas às eleições nacionais para 30% até 2020, bem como aprovou na dieta, em maio de 2018, uma lei que estabeleceu um dever dos partidos políticos japoneses de se esforçar para equilibrar o número de candidatos e candidatas a concorrerem nas eleições. Embora não tenha sido definida em princípio qualquer penalidade em caso de descumprimento da referida lei, não há como negar que esta constituiu um marco no que tange à forma de tratamento da mulher no cenário político.
Apesar de tais esforços, constatou-se no Global Gender Gap Report 2018 uma queda na colocação em relação ao ano anterior, tendo em vista a diminuição do número de mulheres no cenário político – atualmente, apenas 10% da câmara baixa do parlamento japonês é representada por mulheres.
Sobre isso, é de se destacar que o próprio Shinzo Abe tem sido duramente criticado por ter nomeado 4 ministras para sua delegação em 2014, quando do anúncio da política do Womenomics, porém, quatro anos depois, em 2018, ter indicado somente uma mulher para sua delegação de 19 ministros, e para o cargo não tão relevante de ministra de revitalização regional. Tal mudança de comportamento soaria contraditória à política de empoderamento feminino tão defendido até então, mesmo tendo o primeiro ministro alegado que a única indicada, Sra. Satsuki Katayama, teria a “presença de 2 a 3 mulheres”.
Apesar do visível progresso do Womenomics enquanto política de promoção de igualdade de gênero, ainda há muito o que se desenvolver quando falamos em participação das mulheres em cargos de liderança, seja no segmento empresarial como no político. Fica o questionamento se a política do soft law adotada pelo legislador japonês no tratamento da questão da promoção das mulheres será suficiente para mudar o sistema ainda vigente, uma vez que se encontra baseado em uma cultura tão conservadora, ou se a implementação de ações afirmativas, com estabelecimento de penalidades e prazos para cumprimento, seria mais rápida e efetiva na conscientização da importância da representatividade e empoderamento da mulher.
Foto: https://www.weforum.org/agenda/2015/04/how-can-we-improve-gender-equality-in-japan/